Excerto da carta intitulada "O Brasil e Portugal" de Eça de Queiroz, publicada no Jornal do Porto para onde escreveu as suas Cartas de Inglaterra a partir de 1877, quando exerceu o papel de cônsul. Aqui se dá a imagem que os europeus e, mais concretamente os ingleses, tinham de Portugal no século XIX:
"Com efeito, o juízo que, de Badajoz para cá, se faz de Portugal, não nos é favorável, nós sabemo-lo bem - e não nos inquietamos! Não falo aqui de Portugal como Estado político. Sob esse aspecto gozamos uma razoável veneração. Com efeito, nós não trazemos à Europa complicações importunas; mantemos dentro da fronteira uma ordem suficiente: a nossa administração é correctamente liberal; satisfazemos com honra os nossos compromissos financeiros.
Somos o que se pode dizer um povo de bem, um povo boa pessoa. E a nação vista de fora e de longe, tem aquele ar honesto de uma pacata casa de província, silenciosa e caiada, onde se pressente uma família comedida, temente a Deus, de bem com o regedor, e com as economias dentro de uma meia...
A Europa reconhece isto; e todavia olha para nós com um desdém manifesto. Porquê? Porque nos considera uma nação de medíocres; digamos francamente a dura palavra: porque nos considera uma raça de estúpidos. Este mesmo Times, este oráculo, augusto, já escreveu que Portugal era, intelectualmente, tão caduco, tão casmurro, tão fóssil, que se tornara um país bom para se lhe passar muito ao largo e atirar-lhe pedras."
Eça de Queirós, Cartas de Inglaterra, Publicações Europa-América, pp. 115.
Este texto veio-me à memória aquando das declarações do Presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem (Ministro das Finanças holandês), que acusou os países do Sul da Europa (onde se inclui, logicamente, Portugal) de gastarem o seu dinheiro em "copos e mulheres" e "depois pedirem que os ajudem". A imagem cultural de povos do Norte trabalhadores, rigorosos, austeros e eficientes e povos do Sul preguiçosos, esbanjadores, emocionais e desorganizados, é algo que está enraizado na sociedade e há séculos como se percebe, também, pelo texto de Eça. E nem a mega globalização em que vivemos parece capaz de apagar estes preconceitos.
ResponderEliminar